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sábado, 24 de outubro de 2009

Poesias Modernistas

Os ombros que suportam
o mundo
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à pota, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco me importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança:
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue,
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns achando bárbaro o espetáculo,
preferiam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida, apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond de Andrade

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